O forte desequilíbrio financeiro do setor público foi um dos principais motores da superinflação no período que antecedeu o lançamento do Plano Real. Tanto assim que, para garantir a estabilidade monetária, o país recorreu a mudanças estruturais capazes de neutralizar esses desequilíbrios. Estados e municípios tiveram as dívidas com a União reestruturadas. Estatais foram privatizadas, e diversos serviços que anteriormente dependiam exclusivamente do setor público terminaram transferidos a concessionários privados.
Mas todo esse esforço poderia se perder se, institucionalmente, o Brasil não tivesse avançado para evitar o endividamento público excessivo. E a viga mestra desse novo arcabouço institucional é a Lei de Responsabilidade Fiscal. Por meio dela, os entes federativos foram obrigados a manter uma relação proporcional entre o endividamento contraído e a receita líquida disponível. Estados e municípios tiveram um prazo para se adaptar, e quase todos se enquadraram. E, também por força da lei, governadores e prefeitos tiveram que buscar soluções para o problema da folha de servidores inativos.
Vencimentos de funcionários públicos e dos parlamentares precisam respeitar limites e uma proporção entre eles, o que tem contribuído para eliminar graves distorções que existiam na remuneração de grupos de servidores.
A lei foi fundamental para disciplinar a realização de despesas durante o mandato dos governantes. Sem fonte de receita definida não é possível contrair novas despesas ou mesmo realizar investimento que os sucessores não consigam financiar.
Causa, portanto, apreensão o fato de estar em curso uma onda de pressão de estados e municípios a fim de flexibilizar a lei, para que possam se endividar mais. O próprio governo federal propõe alterar a LRF, com o objetivo de continuar indefinidamente com a política de tópicas desonerações de impostos, para as quais, entendem especialistas, teria de definir fontes firmes de custeio, como estabelecido na legislação. Isso com a finalidade de proteger o equilíbrio das contas públicas.
Um risco é a perda de arrecadação, causada pelas desonerações num primeiro momento, vir a ser compensada por endividamento público — como tem sido feito, sem maiores cuidados, na capitalização de bancos públicos. Daí o crescimento da dívida bruta.
Questão idêntica ocorre com estados e municípios. Como eles têm sido afetados pela queda nos repasses federais aos entes federativos, devido às próprias desonerações, a permissão para o endividamento seria uma forma de contrabalançar as perdas de receita. Não é esse o caminho para se resolver o problema.
O momento é especialmente perigoso para a estabilidade econômica. Falta sensatez em tudo isso.