Embora as mulheres tenham conquistado o direito ao voto no Brasil há 80 anos,
esse fato não contribuiu para assegurar uma relação de equidade na representação
política. Apesar de o país ser presidido por uma mulher, a atual bancada
feminina na Câmara representa apenas 8,77% do total da Casa, com 45 deputadas.
No Senado, há 12 senadoras, entre os 81 lugares.
Na opinião do professor José Eustáquio Diniz Alves, doutor em demografia e
professor titular do mestrado em estudos populacionais e pesquisas sociais da
Escola Nacional de Ciências Estatísticas (Ence), os partidos políticos
brasileiros ainda funcionam como "um grande funil" que impede o aumento da
participação política feminina.
"É como um vestibular que vai selecionando. Nessa seleção, as mulheres ficam
de fora. Quem decide a lista de candidatos são os homens", ressaltou. "Se
fizermos uma comparação com a proporção nas câmaras de outros países, o Brasil
ocupa o 142º lugar. Há 141 países com participação melhor de mulheres. Estamos
piores que o Afeganistão, Iraque, o Timor Leste, Moçambique e Angola",
acrescentou Alves, que também contesta a premissa de que a mulher brasileira não
vota em mulher.
Essa baixa proporção de mulheres ocupando cadeiras no Congresso Nacional foi
motivo de cobrança feita ao governo brasileiro, na semana passada, pelos peritos
do Comitê das Nações Unidas para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação
contra a Mulher (Comitê Cedaw). Os questionamentos ocorreram durante a
apresentação, em Genebra, do relatório produzido por organizações da sociedade
civil brasileira.
Hoje (24), o Brasil comemora os 80 anos do direito de voto feminino. As
mulheres passaram a ter o direito de voto por meio do decreto assinado em 1932,
pelo presidente Getúlio Vargas.
"As mulheres brasileiras conquistaram o direito de voto em 1932, mas ainda
não conseguiram ser representadas adequadamente no Poder Legislativo. Até 1998,
as mulheres eram minoria do eleitorado. A partir do ano 2000, passaram a ser
maioria e, nas últimas eleições, em 2010, já superavam os homens em 5 milhões de
pessoas aptas a votar. Esse superávit feminino tende a crescer nas próximas
eleições. Contudo, existem dúvidas sobre a possibilidade de as mulheres
conseguirem o apoio dos partidos para disputar as eleições em igualdade de
condições", destacou.
No último congresso do PT, no fim do ano passado, as mulheres conseguiram
aprovar a regra da paridade para as eleições que ocorrem em 2013. Mesmo sendo o
partido da presidenta da República, Dilma Rousseff, a aprovação enfrentou
resistência dentro da legenda.
Apesar das resistências, o PT foi o primeiro partido brasileiro a decidir
pela paridade. Os outros não garantiram esse direito às mulheres filiadas e
tentam seguir a regra prevista na lei que prevê a cota de 30% para as mulheres
nas candidaturas proporcionais.
"Nas eleições passadas, nenhum partido conseguiu cumprir as regras, muitos
acabaram apelando para candidaturas laranja, aquelas em que se coloca a
secretária, a mãe, a tia como candidatos, mas não dá às mulheres as condições de
disputar uma eleição de fato", destacou José Eustáquio Diniz Alves.
"A Lei de Cotas determina que os partidos inscrevam pelo menos 30% de
candidatos de cada sexo e dê apoio financeiro e espaço no programa eleitoral
gratuito para o sexo minoritário na disputa. Os estudos acadêmicos mostram que
se houver igualdade de condições na concorrência eleitoral, a desigualdade de
gênero nas eleições municipais poderá ser reduzida", destacou o professor, que
não concorda com a opinião de que o eleitorado brasileiro, mesmo
majoritariamente feminino, não vota em mulher.
"Existe essa ideia de que a mulher brasileira não vota em mulher e isso não é
verdade. As eleições de 2010 provaram que isso não se sustenta. Tínhamos nove
candidatos à Presidência da República, sendo sete homens e duas mulheres. Essas
duas mulheres levaram dois terços dos votos", defendeu.