25/06/2012 | POLÍTICA
O economista José Sérgio
Gabrielli está há 100 dias à frente do planejamento do Estado. Nesta entrevista
à Tribuna, o petista aponta os principais gargalos para o desenvolvimento da
Bahia (sobretudo a falta de logística), cita a necessidade de ‘azeitar’ a máquina
e atacar o excesso de superposição de atividades do governo, preparando a pasta
para atuar por projetos. Questionado, Gabrielli diz não concordar com a ideia
de que há morosidade nas ações do governo Wagner. Muito pelo contrário. Para
ele, o momento é de pujança. Até 2015, serão investidos R$70 bilhões pela
iniciativa privada, somados aos R$20 bi do poder público
Tribuna da Bahia – Cem dias de José Sérgio Gabrielli à frente do Planejamento
do Estado. O que foi feito nesse período?
José Sérgio Gabrielli – Quando eu cheguei à Bahia, eu entrei num time que já
estava jogando. Portanto, tive que me adaptar às orientações táticas do
governador, que é o técnico. Então, objetivamente, o primeiro elemento que
coloquei em prática nesse período foi atuar para conhecer quais eram as
principais atribuições das diversas secretarias do Estado. No segundo momento
foi possível identificar onde é que estava havendo superposição de atividades,
necessitando armar o jogo de forma um pouco distinta. No terceiro momento foi
preparar a Secretaria de Planejamento para analisar e ser capaz de dar
respostas a cada projeto de ação da secretaria. Um quarto momento foi a
preparação da Lei de Diretrizes Orçamentárias. Um quinto momento importante
agora é a gestão de 2012 com definição de prioridades e fazendo com que a
gestão de 2012 acabe impactando o orçamento de 2013.
Tribuna – O que é que falta para a gestão do governador Jaques Wagner ganhar um
ritmo de mais celeridade?
Gabrielli – Concluindo, esse processo, ainda tem outro componente que é
importante, que é componente de buscar acelerar os processos de captação de
recursos não tradicionais, ou seja, buscar novas fontes de financiamento para o
estado. Esse conjunto de ações está em andamento, evidentemente que se você me
perguntar, concretamente, o que isso deu, eu não tenho ainda como dar uma
resposta, são 100 dias, mas todas essas áreas de atuação estão em plena
atividade. Acredito que o governo vem fazendo muita coisa, ou seja, o conjunto
de ações do governo é um conjunto extraordinariamente amplo. Acho que a Bahia
tem hoje tanto na área do investimento privado, como na área do investimento
público, um pacote de investimentos, um pacote de projetos, talvez o maior da
história. Nós temos hoje cerca de R$ 70 bilhões de investimentos privados
planejados para a Bahia até 2015 e temos do setor público, só na
infraestrutura, cerca de R$ 20 bilhões. Então significa que você tem aí, do
setor público, governo do estado, governo federal e governos municipais, cerca
de R$ 20 bilhões, mais R$ 70 bilhões, são R$ 90 bilhões, são US$ 45 bilhões. Só
pra lembrar, o Polo Petroquímico custou US$ 6 bilhões. Nós estamos com
investimentos que correspondem, em termo de valor, a sete ou oito vezes o Polo
Petroquímico, portanto, é um enorme volume de investimento nos próximos anos.
Tribuna – O senhor trouxe alguém do seu staff da Petrobras pra dar suporte
nesse trabalho na Secretaria de Planejamento?
Gabrielli – Ainda não. Mas vou trazer.
Tribuna – E isso não deixa o senhor limitado, sem uma equipe mais próxima, que
está mais acostumada com seu ritmo de atuação?
Gabrielli – Eu cheguei e não mudei o time. Eu cheguei e estou jogando com o
time existente. Eu trouxe o chefe de Gabinete, que é do estado, um amigo meu de
muito tempo, que trabalhava na Secretaria de Educação e é meu chefe de Gabinete
agora. E estou trazendo um gerente da Petrobras que está vindo cedido para
trabalhar comigo a partir do próximo mês, mas o resto dos superintendentes eu
mantive todos eles, eu não troquei ninguém. Quem saiu, saiu por vontade
própria.
Tribuna – Quando o senhor assumiu, o senhor falou em fazer ajustes na máquina.
O senhor encontrou alguma dificuldade em mexer em alguma peça, em fazer algum
ajuste?
Gabrielli – Não, eu preferi testar as pessoas que estavam nas diversas
posições. Então eu tive o que eu estou tentando fazer, uma gestão por projetos.
Estou identificando claramente o que cada pessoa faz, estou dando pra ela
prazos e metas e estou discutindo o processo de encaminhamento desses prazos e
metas. Estou montando, dentro da secretaria, um sistema de acompanhamento dos
projetos que vai permitir uma visão gerencial das atividades que estão sendo
feitas e, com isso, eu tenho uma visão muito macro de todas as atividades que
estão sendo feitas pela secretaria. Com prazos, com metas, com
responsabilidades.
Tribuna – Quando a população de um modo geral vai perceber esse novo processo
de organização interna?
Gabrielli – Não. Isso não tem uma relação direta com a população, porque não
tem execução direta das atividades de governo. Isso aí você vai ter uma
aceleração dos processos de integração dos diversos órgãos executores, você vai
ter uma melhoria do uso dos recursos com menos desperdício, você vai ter mais
eficácia na formulação de projetos pra buscar recursos externos, você vai ter
um processo de acompanhamento do orçamento de forma a integrar os dados
financeiros com a execução, ou seja, você vai ter uma atuação na atividade
meio, a gente não vai ter uma atuação na atividade fim. O que nós vamos fazer é
que as secretarias, que são as executoras das obras, das atividades, elas vão
estar mais coordenadas, vão estar mais azeitadas e jogando nas posições mais
adequadas.
Tribuna – O senhor tem encontrado alguma dificuldade interna, dentro do próprio
governo, para se movimentar?
Gabrielli – Não, nenhuma dificuldade. Eu acho que o problema é que a equipe do
governo é muito motivada, muita atividade sendo feita, eu acho que, em alguns
casos, muita gente fazendo a mesma atividade. É preciso, digamos, arrumar um
pouco mais isso, mas o governo está muito ativo. Eu não concordo com a ideia de
que não há atividade no governo, que há morosidade na atividade do governo. O
governo está muito ativo, agora talvez haja muita energia que é usada na
atividade pra preparar a atividade.
Tribuna – O governo vai conseguir construir um sistema de mobilidade eficiente
para a Copa ou qual o planejamento do Estado para o mundial?
Gabrielli – Olha, eu acho que nós temos na mobilidade uma questão central para
Salvador. A consulta pública que foi lançada apresenta um projeto que me parece
extremamente importante e tem algumas características que valem a pena chamar a
atenção. Primeiro, ele não é um projeto completo, no sentido que resolve todos
os problemas. Ele é uma linha que vai conectar a linha 1, que vai expandir a
linha 1 até Pirajá e vai fazer a linha 2 até Lauro de Freitas, basicamente no
eixo da Paralela. Esse é um eixo troncal, é um tronco de um sistema que vai
precisar fortemente de redefinir as rotas dos ônibus. A redefinição das rotas
dos ônibus vai ocorrer para utilizar, otimizar e potencializar as diversas
estações de metrô que vão existir nesse trajeto. Vamos ter uma reorientação das
rotas de ônibus, que serão rotas mais curtas, mais rápidas, algumas circulares,
que vão permitir, portanto, uma utilização do espaço urbano de Salvador de
forma mais adequada. Por outro lado, nas linhas troncais de longa distância,
você vai, portanto, tirar também o volume de automóveis circulando.
Tribuna – O Porto Sul é colocado como uma prioridade do governo. O senhor tem
feito alguma gerência, junto ao governo federal, para destravar esse projeto?
Gabrielli – O governo tem o secretário Rui Costa (Casa Civil), que é a pessoa
que está fazendo essas negociações com a Valec, com o governo federal. Nós
estamos trabalhando no desenvolvimento dos projetos do entorno das plataformas,
dos pátios de manobra da Fiol. A ferrovia, que termina no Porto Sul, ela vai
ter vários pátios de manobra, que será onde o trem vai parar e esses pátios de
manobra vão ter impactos importantes nas regiões em torno desses parques. Nós
estamos reformulando as análises no entorno desses locais para fazer políticas
regionais adequadas para maximizar o efeito positivo da ferrovia no
desenvolvimento regional.
Tribuna – Qual é o principal gargalo hoje para o desenvolvimento da Bahia?
Gabrielli – Eu acho que nós temos alguns gargalos. A logística baiana e a
logística nordestina, ou seja, a capacidade de transportar cargas, pessoas,
dados e informações, ela é um limitador. Então nós temos no plano de
transformação da logística, nós vamos ter essa Ferrovia Oeste-Leste, que é uma
ferrovia que cruza o sudoeste do estado. Nós vamos ter que retomar a discussão
sobre a hidrovia do São Francisco, portanto, vai ser na direção Sul-Norte. Além
da hidrovia do São Francisco, em Juazeiro, nós vamos ter uma plataforma
logística e, de Juazeiro, nós vamos reforçar a FCA até o porto de Salvador e de
Aratu. De Salvador e Aratu essa ferrovia vai até Brumado. Então nós vamos ter
um polígono de logística novo do ponto de vista de modais ferroviários,
hidroviários e rodoviários. Por outro lado, nós estamos intensificando as
linhas de transmissão elétrica, que vão permitir explorar mais ainda o
potencial eólico do semiárido baiano, na região de Caetité, e nós vamos ter
que repensar e expandir o plano estadual de banda larga, para permitir também
uma densificação da malha de fibras óticas e de banda larga para a inclusão
digital no estado. Portanto, esse conjunto de ações são ações na
infraestrutura. Então, nós temos limitações na logística, que estão sendo
resolvidas, temos limitações na inovação, que estão sendo tratadas, temos uma
política de inclusão social que expande o mercado interno, resta a qualificação
profissional. Nós precisamos que o nosso pessoal esteja preparado para utilizar
esse crescimento de forma adequada.
Tribuna – O PPA do governo federal prevê R$ 19 bi para a Bahia até 2015 e R$ 42
bilhões para Pernambuco. A que o senhor atribui isso? Falta projeto ou falta
articulação política?
Gabrielli – Os projetos de Pernambuco estão fazendo o ciclo de investimento que
a Bahia fez na década de 50. Na década de 50, nós tivemos refinaria. Pernambuco
está tendo refinaria agora. O polo petroquímico é outra parte importante no
crescimento de lá. Nós tivemos o nosso polo na década de 70. Então, Pernambuco
está com um ciclo de investimento em investimentos pesados onde o setor público
entra fortemente, na área petroquímica, na área de refino, que a Bahia teve no
passado. Então, é evidente que não dá para comparar nesse nível simplesmente o
valor numérico do investimento pernambucano e o investimento baiano. Por outro
lado, se nós olharmos o volume de investimentos nas universidades, se nós
olharmos o volume de investimentos nas escolas, se nós olharmos o volume de
investimentos em moradia, se nós olharmos o volume de investimento no
saneamento básico na Bahia, nós estamos melhor do que Pernambuco.
Tribuna – A formação de novas parcerias público-privadas poderia ser usada para
destravar processos de desenvolvimento, inclusive na logística do Polo?
Gabrielli – Eu acho que em algumas coisas, sem dúvida nenhuma. Nós vamos ter
esse ano agora na mobilidade urbana. A Arena Fonte Nova foi uma PPP. O Hospital
do Subúrbio foi uma PPP. A BA-093 é uma parceria PPP. Agora, eu acho que a parceria
público-privada é importante, mas não é universal. Não vale pra tudo, nem vale
para qualquer situação. É preciso identificar aquilo que se adapta mais no
sentido de ser uma forma específica de organização da atividade econômica. No
entanto, eu acho que aproximação com o empresariado é fundamental para
viabilizar a criação de novas oportunidades de emprego e renda, como para
viabilizar a expansão econômica propriamente dita no estado.
Tribuna – De dentro da máquina do estado, qual a avaliação que o senhor faz
hoje do governo?
Gabrielli – Olha, eu acho que o governo tem uma atividade, como eu disse, muito
grande. Talvez a gente pudesse, digamos, ter mais efeito com o conjunto de
atividades que a gente está fazendo se a gente tivesse um pouquinho mais de
coordenação e de diminuição das superposições que nós temos.
Tribuna – O senhor acha que vai ser possível atingir isso num curto espaço de
tempo, dando uma velocidade maior na máquina?
Gabrielli – Acho que o governador Wagner tem plena consciência disso, ele é um
entusiasta da gestão mais eficiente, ele é um entusiasta de avançar além dos
processos de abertura democrática para que as ações sejam mais eficazes, e eu
acho que ele vai conduzir o governo nessa direção.
Tribuna – Falando agora sobre sucessão... Qual o motivo de o candidato Nelson
Pelegrino ter dificuldade em tomar fôlego?
Gabrielli – Acho que Nelson está fazendo a parte dele. A visibilidade dele está
bastante grande. Não concordo que não há visibilidade da candidatura de Nelson.
Acho que o quadro político de Salvador, no entanto, é um quadro político que o
PT conseguiu uma frente sem os seus aliados tradicionais. O PCdoB tem uma
candidata colocada nesse momento e isso vai fazer com que a tática seja uma
tática de segundo turno, pelo menos nesse momento. As convenções vão ser nessa
semana, a do PT é no dia 30. Até lá, o quadro que se apresenta hoje é um quadro
em que a base do governo vai ter mais de um candidato.
Tribuna – Independente de qual seja o candidato a vencer esta eleição, quais devem
ser as prioridades do próximo prefeito?
Gabrielli – Eu acho que Salvador precisa de algumas intervenções importantes.
Uma é em mobilidade urbana, sem dúvidas. E nós precisamos investir na área de
saúde, a cobertura do PSF, do programa de saúde da família, que é ridiculamente
baixa. Nós precisamos avançar na área de saneamento, na capacidade de
saneamento da cidade. Nós precisamos avançar num programa para as orlas, tanto
a orla do interior da Baía de Todos os Santos como da orla atlântica. Nós
precisamos repensar o Centro Histórico. Então é todo um conjunto de questões
que Pelegrino está trabalhando nisso e que eu acredito que vá apresentar
alternativas importantes.
Tribuna – O governo não poderia estar ajudando e investindo em intervenções
como essas, como na orla, como no Centro Histórico?
Gabrielli – Nós temos uma constituição em que a distribuição de funções é
clara. O espaço urbano é competência do município. O estado não pode estar
substituindo o município na gestão do espaço urbano. Além do mais, existem 417
municípios no estado. O governo do estado não pode cuidar só de Salvador. Tem
que cuidar dos 417 municípios do estado. A presença do estado na área da saúde
é também limitada. O estado trabalha no Sistema Único de Saúde com duas
funções. O posto de saúde e a saúde da família são responsabilidades
municipais. O transporte urbano, o ônibus, o estacionamento, o trânsito é
responsabilidade do município.
Tribuna – Seu programa de rádio causou ciúmes em algumas pessoas, que estavam
de olho em 2014. Como viu os questionamentos?
Gabrielli – Qualquer um pode ter a interpretação que quiser ter. É só ouvir o
programa nas quintas-feiras. É um programa de discussão de temas econômicos. Eu
sou um profissional da área há 40 anos. Eu formei em 1971. Sou atuante na área
de economia há mais de 40 anos. Então é absolutamente normal que eu fale de
economia, que eu fale de programas econômicos do estado. A interpretação disso
como campanha eleitoral é uma interpretação completamente equivocada. Os
programas têm sido basicamente de discussão de temas relevantes para a economia
baiana, do ponto de vista econômico.
Tribuna – Incomodam os rumores de que o governador Jaques Wagner teria uma
predileção por uma candidatura de Rui Costa em 2014?
Gabrielli – Eu acho que esse é um tema precipitado. O governador, eu não
acredito que esteja discutindo 2014 agora. O governador sabe que 2012 tem
eleição municipal e é importante, e ele tem um programa de governo
extraordinário para desenvolver. E está desenvolvendo. Ele tem se dedicado
fortemente à gestão do estado, à execução das obras e à execução dos projetos.
E à eleição de 2012. Eu acho que, nesse momento, a eleição de 2014 está muito
longe ainda.
Tribuna – O que a gente pode esperar, o que as pessoas podem esperar da bagagem
que o senhor traz para o planejamento do estado a partir de agora?
Gabrielli – Eu acho que a Secretaria do Planejamento está começando a ter
alguns instrumentos dentro dela para poder desempenhar um papel mais
articulador no estado. Eu espero que a minha contribuição seja justamente essa:
um articulador das ações do governo, azeitar a máquina sob o comando do
governador Jaques Wagner.
Tribuna – É possível então azeitar a máquina e dar um ritmo de mais celeridade
ao governo?
Gabrielli – Eu não sei se necessariamente dar ritmo de mais celeridade, porque
depende do preparo físico dos atletas, mas, com certeza, fazer uma ação mais
integrada da ação do governo é uma intenção importante.